terça-feira, 1 de março de 2016

Eu só quero morrer se estiver vivendo

Você já se suicidou?

Ainda não?

Que pena.

Eu já e recomendo, acredite. No início, quando você começa a cogitar a ideia, dá um certo medo, uma angústia toma conta de seu peito, seu coração dispara, sua pressão sobe e por algumas noites você não consegue dormir direito. Você fica como que tomado por aquela mistura de obsessão com medo e a ansiedade só faz aumentar. Depois vem a fase do conflito interno entre suas verdades absolutas e aquele novo passo à sua frente que vai de encontro a tudo que você sempre acreditou e pregou aos quatro cantos. Vem então a fase da elaboração mental da desculpa que fará você acreditar que você tomou a atitude mais correta e, por que não dizer, a mais corajosa. Sim, coragem, isto é necessário e muito. Muitos dizem que suicídio é um ato de covardia, mas estes nunca se suicidaram. Só quem já se suicidou, como eu, sabe do tanto de coragem que é necessário. Suicídio não é para qualquer um, você pode ter certeza disso. Entre uma angústia e outra, entre uma ansiedade e outra, entre uma insônia e um pesadelo, entre um vômito e uma diarreia inexplicáveis, você vai refinando seu projeto e, quando vê, já está ali, naquela esquina da vida, onde não há outra decisão plausível, onde e quando o único passo que lhe é possível é em direção ao precipício, e você sabe que não há precipitação alguma nisso, como alguns dirão. Tudo foi muito bem pensado, e, assim, calmamente, você dá o passo.

Se você planeja fazer o mesmo e é viajante de primeira viagem, aqui vai um conselho de alguém que já se suicidou algumas vezes: curta a viagem. Sim, chamo-a de viagem, não de queda. Saboreie cada centímetro sem chão sob seus pés, observando cada minuto de passado que vai passando frente a seus olhos. Não fique naquela angústia ridícula balançando os pés, tentando encontrar algo fixo e estável para se apoiar, pois não há. Relaxe, você está se suicidando e já não há mais volta, agora é só seguir, querendo ou não. Então, se nesta hora você fizer a idiotice de sentir medo e fechar os olhos, você perderá muito e seu suicídio poderá ficar meio sem razão de existir, o que provavelmente o levará a outros suicídios, além do que você perderá a graça e umas das maiores recompensas que um suicídio proporciona. Então, meu amigo suicida, seja esperto, abra seus olhos e observe o desmoronamento aparentemente lento que só você terá o privilégio de assistir e a capacidade, se é que terá, de entender. Também não tente se segurar a algum galho perdido ladeira abaixo. Você poderá se machucar e, pior, sobreviver, o que será pior que o suicídio em si. No suicídio, quer dizer, num bom suicídio, assim, merecedor de respeito, a queda não se dá só para baixo, mas também para trás, creio que por isso a chame de viagem. E caindo assim, chega uma hora em que você para. Sim, você simplesmente para de cair e a viagem termina, não porque você quis ou planejou, nenhum suicida de respeito tem o poder de planejar onde vai parar, isso não seria justo, você simplesmente para onde parou e aceita isso como um fato. Afinal, agora não é momento para outro suicídio. Um suicídio após o outro pode ser fatal.

Começa então a vida nova. Sim, há vida após o suicídio, embora poucos acreditem nisso, principalmente quem está no processo de suicídio. Quem se suicida nunca o faz pensando nesta vida futura, pois ele, mesmo se ele já se suicidou outras vezes, nunca acredita nesta possibilidade. Mesmo já tendo passado por isto outras vezes, ele acredita que após aquele suicídio não haverá mais vida. Até porque, um suicida que se preze não se suicidaria se acreditasse na hipótese de vida após o suicídio, ele seria um hipócrita, e suicidas podem ser tudo, mas nunca hipócritas. Eles são transparentes a ponto de parecer mentira e irracionalidade, algo que ultrapassa a inocência e só pode ser classificada como ingenuidade extrema. Suicidas são pessoas perigosas tamanha a credulidade que têm. Ou seja, eles não são hipócritas e jamais se suicidariam se suspeitassem que haveria vida os esperando após o suicídio. Por mais suicídios que já tenham cometido, eles sempre acreditam que aquele será o último e definitivo. Por esta razão, há sempre um novo medo que ele jura que nunca sentiu antes, mas sentiu. Por ser assim tão inocente, ele acha que agora será para sempre, e esta é a única possível motivação de um suicida honesto e verdadeiro: saber, ou acreditar, que agora será para sempre, que não haverá mais vida possível. Mas sempre haverá.




Ariana Grande - Break Free ft. Zedd



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