Anna,
Há algumas semanas eu escrevi que não precisava de
você. Mas como a capacidade de
admitir que cometeu um erro é a virtude dos sábios, e a modéstia passa longe,
eu admito: eu estava errado. Eu preciso de você sim. Só perceba que precisar
não significa ser dependente. Eu preciso comer legumes – o que eu solenemente
não faço há trinta e cinco anos. Eu preciso beber mais água e comer menos
fritura, tampouco faço nenhuma das duas coisas. A gente precisa do que nos faz
bem, e eu preciso de você.
Eu preciso de você pra me acalmar
quando eu estiver agitado, e pra me agitar quando eu estiver calmo demais. Eu
preciso ouvir a sua voz irritada com o mundo inteiro me falando, no telefone,
“tô com saudade, quero te ver logo”, como se eu fosse um oásis no mar de
problemas e chatices da sua vida. Eu preciso de você pra cuidar dos problemas
que eu não tenho e invento, eu preciso ouvir que você quer que eu cuide de
você, que eu não me afaste. Eu preciso da sua calma pra fazer ficar tudo bem um
minuto depois de termos uma discussão.
Eu
preciso da sua mão no meu cabelo, mesmo sabendo que você está doida pra falar
que meu cabelo tá uma merda. Eu
preciso te ouvir dizer que gosta de mim, que me adora, porque eu sei o quanto
significa pra você dizer isso. Eu preciso de você dizendo que quer dormir na
minha casa só pra ganhar cafuné. Eu preciso muito de você dizendo que não quer
fazer mais nada, só ficar comigo. Às vezes eu realmente preciso que nós não
façamos nada e só fiquemos um com o outro. Eu preciso do seu carinho, do seu
sorriso bobo quando você passa horas falando apaixonadamente sobre teatro e só
percebe depois que eu estava o tempo todo sorrindo, te achando linda e
admirando a sua paixão. Aí, nessa hora, eu preciso do seu sorriso abaixando a
cabeça e olhando de soslaio pra baixo.
Eu
preciso das suas ideias aparentemente simples no meu trabalho, e eu preciso da
sua reação de espanto quando eu dou uma boa ideia pra algo relacionado aos seus
estudos, afinal, eu não sou o maior fã de teatro do mundo. Eu preciso de você
pra tirar a minha vida monótona dos trilhos, pra me fazer começar a fazer um
trabalho importante na véspera porque nós passamos cinco dias grudados. Mas como eu vou resistir aos seus “Tô com saudades” ou “vai pra
casa, toma banho e volta pra cá!”? não dá pra resistir, e nem eu quero
resistir. Eu preciso do frio na barriga que antecede você dizer
que gosta de mim e sentiu a minha falta, quando nos encontramos e você está
irritada com outra coisa, e eu não sabia se ia levar um soco na cara ou um
longo e carinhoso beijo. E geralmente eu ganho o beijo. Eu preciso de você pra
me fazer voltar pro caminho, e pra me fazer perder o rumo quando o caminho está
chato demais. Eu preciso acordar às seis e meia da manhã e me oferecer pra te
levar na faculdade, só pra te ver feliz por não ter se atrasado. Eu preciso que
você me chame pra tomar café da manhã na faculdade com você, quando eu achava
que nós dois ainda éramos algo clandestino pra isso.
Eu não como verdura, não bebo água o
suficiente, não levo agasalho quando tá frio. Não dirijo com cautela, não
escovo os dentes cinco vezes por dia, não bebo menos refrigerante. Eu não ando
de bicicleta, não faço exercícios e vejo TV de perto. Mas de você eu preciso de
verdade. Mesmo tentando me obrigar a comer verdura, a dirigir com cuidado, a
andar de bicicleta e a fazer exercícios.
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